segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Futebol no Minho: Como ir de Espanha a Marrocos em 20 minutos


Gritos, emoções fortes, aplausos. Tochas, petardos, cadeiras pelo ar. Claques. Fala-se de algo mais que futebol: paixão. Amor ao clube, independentemente do onze.
           
São mais do que simples adeptosEm tronco nu, com faixas, entoando cânticos, eles são o 12º jogador. Os outros, aqueles que ainda estão no balneário a ouvir o sermão do mister, esperam a hora da partida. A claque é que já está no campo muito antes de soar o apito, e começa a fazer-se ouvir. Uma voz puxa a outra e a claque puxa o estádio. É a festa do futebol.
            
Estamos no Minho, onde o desporto traça fronteiras. A placa, evidente, é o único objecto que separa Guimarães, ou Espanha, e Braga, também conhecida como Marrocos. Mais do que uma sinalização geográfica, serve de veículo de mensagens entre os dois territórios: “Guimarães é merda”, escreve-se de um lado. “Braga é merda”, escreve-se do outro. Não importa a originalidade: a ideia é perceptível.



(Figura 1 - As rivalidades evidenciadas 
numa paragem de autocarros)

A rivalidade entre o Vitória de Guimarães e o Sporting de Braga não é indiferente a ninguém. “A tensão é um sentimento que, uma semana antes do dérbi, entra pela cidade e não tem como ficarmos indiferentes a isso”. Quem o diz é o guarda-redes do Vitória, Nilson. Para ele, os fanáticos da bola são um apoio fundamental a qualquer clube, apesar de “serem emoção e não razão. São muito emotivos e levam tudo ao extremo. Se tiverem que brigar e matar, eles são capazes de o fazer”.


Do outro lado, em Marrocos, o actual número um das redes nacionais e bracarenses, Eduardo, não hesita: “As claques são o espectáculo dentro do espectáculo”. O guarda-redes esboça um sorriso de quem recorda jogos fervorosos.


Continuamos no Minho, onde o futebol desperta amores e ódios intensos. É dia de jogo. As forças policiais circundam a cidade anfitriã e não deixam que as claques se cruzem. É o risco de uma batalha campal, onde elementos da Cidade-Berço e da Cidade dos Bispos se confrontam pela honra. Por vezes, há sangue. É o preço a pagar pelo amor à instituição.


Estamos em Guimarães. A sala tem vista para o complexo do Vitória. Os jogadores treinam e o ambiente é calmo. O presidente senta-se e franze o sobrolho: “Uii, as claques!”. Mesmo assistindo aos jogos lá do alto, Emílio Macedo deixa transparecer um certo desassossego: “As claques não são fáceis. Quando as coisas correm bem apoiam, quando correm menos bem, chamam nomes”.


O ambiente continua calmo, no outro “país”. A sala está iluminada pelo sol que finalmente apareceu. António Salvador, presidente do Sporting de Braga, afunda-se na cadeira, relaxado. O assunto não parece ser o seu favorito, mas não receia dizer que as claques funcionam como uma motivação aos jogadores. Porém, não hesita em criticar os comportamentos mais violentos dos seus membros: “Não é bonito que existam claques que vão para o estádio para criar conflitos com as claques dos outros clubes”. 


Com mais ou menos reticências, existe um consenso entre as direcções dos dois clubes: desde que haja civismo, os grupos organizados são necessários para animar o futebol. De forma quase paternal, Emílio Macedo defende que “as claques deveriam conviver antes dos jogos, com respeito. Era bonito! Há miúdos que andam no futebol desde os 4/5 anos e não é um ambiente saudável”.


Os líderes das claques minhotas não pensam da mesma forma. Bracara Legion e White Angels são velhas conhecidas, mas não amigas. O amor por um símbolo é comum; o branco das camisolas também. Mas as semelhanças acabam por aqui. Não se deixem enganar: o ódio existe e veio para ficar.


“Paulinho” tem 24 anos e é o homem forte da Bracara Legion. Para ele, a rivalidade com o Guimarães é, sobretudo, necessária. É antiga e deve ser estimada como uma página da história minhota. O clube é o seu orgulho e é por ele que vibra e grita. Fala da violência associada às claques: “Há pessoas que têm a maneira de extravasar o fanatismo partindo tudo; mas eu sou contra e nunca fiz isso”. O líder não esconde que “por vezes, nem tudo corre bem. Há espaço para melhorar”.


Com um olhar sempre atento, “Paulinho” (como é conhecido entre as claques) lamenta a ideia negativa criada pelos média em torno dos grupos de adeptos: “Há claques boas e claques más. E, por vezes, por uns pagam outros…”. Amizades entre membros dos White Angels e a Bracara Legion? A resposta é rápida como um relâmpago: “Não! É impensável!”, afirma, levemente repugnado com a ideia.


Não é o único. Dois jovens adornados com símbolos vitorianos conversam na sede dos White Angels, na cidade onde nasceu Portugal. Hélder, de 22 anos, usa um anel com a designação “VITÓRIA” e Ricardo, 27 anos, um cachecol vitoriano. São os responsáveis pela claque e, tal como Paulo, rejeitam qualquer tipo de convívio com adeptos bracarenses: “Se eu descubro que alguém com quem travei amizade é do Braga, coço-me todo!”, diz Hélder, com um leve arrepio. Ricardo ri e concorda. “Não consigo ir a Braga. Só vou lá ver o Vitória. É uma cidade que não interessa…”, completa.


A temperatura na sede dos White parece ser elevada. Ao contrário de “Paulinho”, que diz ser contra a política da Bracara pressionar os jogadores em momentos difíceis com palavrões e assobios, Hélder e Ricardo têm outra convicção: “Pressão? É logo! Quando levamos um festival de bola, entramos pelo estádio dentro. A responsabilidade deles aumenta!”. O tom é natural. Não há espaço para facilitismo. Para os White, “é para trabalhar e ganhar!”, exclamam.


NOTA: Esta reportagem foi feita no âmbito da Unidade Curricular de Imprensa, não sendo, por isso, ciberjonalística.

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